O que significa sentir sua falta.

     Oi. Eu sei que não estamos nos vendo (há tanto tempo) e que eu prometi não mais te procurar, mas pensei em você hoje cedo, e queria dizer que sinto sua falta. Queria que você soubesse que não é como se eu me arrependesse do que aconteceu, ou como se quisesse ter acabado diferente, muito menos que eu gostaria de te ver. Quando eu digo que sinto sua falta, é simplesmente porque sinto sua falta, e é isso que significa.
      Você, uma pessoa que eu julgava conhecer tão bem, me parece mais uma pessoa estranha. E isso significa que (há muito tempo) eu já consigo passar alguns dias sem pensar em você. É como se (por algum tempo), eu simplesmente te esquecesse. E isso parece tão fácil. E parece tão bom.
     Mas aí eu te lembro de novo. Acho uma carta, uma foto, uma música que eu tenho certeza que você acharia ruim e mais tarde me pediria para escutar. E então eu volto a sentir o peso de tudo o que foi perdido.
     Não é como se eu me arrependesse, como se eu quisesse voltar (no tempo) e te pedir para ficar. Eu não me arrependo, e entendo que tivemos muitas razões para terminar. Nós nunca precisamos de razão para nada. E você ainda reclama de que eu quero ter sempre a razão. Mas, no começo, as coisas simplesmente aconteceram, até a razão nos encontrar: nós não tínhamos interesses em comum, não gostávamos das mesmas músicas, da mesma ciência e nem das mesmas pessoas. Não possuímos os mesmos objetivos, e parecíamos estar andando sozinhos. Na verdade, não havia razão alguma para que nos amássemos, mas ainda assim (por muito tempo) insistimos que sim.
     Mas quando as razões vieram, vieram em bando - essas covardes. E até hoje as razões não cansam de chegar. Ao mesmo tempo, isso é bom. Não é como se eu precisasse te dizer adeus, mas também não é como se eu quisesse te ver voltar.
     Eu só queria dizer que sinto sua falta. Como senti falta de outros, antes de você; e sentirei falta mesmo depois que outros vierem. As pessoas nunca se vão por completo. E você continua aqui, embora eu ainda te esqueça vez ou outra. Há sempre algo ausente que atormenta. E hoje você é o que existe de mais ausente em mim. 
     Eu sinto sua falta. E não porque quero voltar atrás ou mudar o que eu fiz. Apenas porque sei que somos tão diferentes, desinteressantes, e com objetivos tão distintos, que acho até engraçado algum dia termos conseguido nos apaixonar.
     Mas não quero me delongar (por tanto tempo). Só quero dizer que espero que você esteja bem, espero que siga seu caminho, que conheça alguém... E ao mesmo tempo, espero que se lembre de mim, que se lembre da nossa falta de razão, das nossas promessas, das nossas ideias. E espero que não mude de ideia tão rápido.
     Espero que sinta falta de mim, embora, deste momento em diante, eu veja razões para não sentir falta de você.

Tic Tac Tédio

Tic Tac.
A sala de espera vazia, as janelas ainda fechadas, e nem sinto o cheiro de café no ar. O relógio perto do bebedouro sumiu. Bato as mãos no bolso e constato ter esquecido o celular. Suspiro. Bebo um copo d'água, ando pela saleta de 6m², mas sento assim que bato a canela numa das cadeiras vazias. Me irrito. Sento e percebo estar sem bolsa. Percebo que pela primeira vez deixei em casa tanto o livro quanto o computador, e justo no dia que esqueci o celular. Constato também que não tenho como ver o tempo passar, e que não tenho o que fazer até que o tempo passe.
Tic Tac.
Vou até minha sala, e lá fico (por quanto tempo?), com a luz apagada e a porta entreaberta, adaptando-me com a disposição das poltronas no escuro. Se esta fosse só a minha sala, com certeza trocaria essas poltronas que sequer no escuro parecem aconchegantes. Acendo a luz: há dois relógios aqui.
Tic Tac.
Tic Tac.
Cada um marcando um horário, com alguns minutos de diferença. Bato as mãos no bolso do jaleco e constato que não tenho um celular ou relógio para conferir. Ainda não tenho o que fazer com o tempo, mas pelo menos agora ele começou a passar.
Debruço na mesa. Rabisco a lateral da folha, escrevo uma canção de que me recordei neste instante. Suspiro. Que música triste. Pelo menos me fez perceber o tempo passar. Pena que não foi necessariamente este o tempo que passou. Quanto tempo faz desde o nosso último instante? Guardo a folha na pasta. Mexo nos anéis e verifico o esmalte das unhas, num segundo que pareceu uma eternidade. O ponteiro parece nem ter se mexido.
Vejo corpos no corredor, vozes distantes, uma risada. Penso em te mandar um "Olá", mas bato as mãos no bolso e constato que esqueci o celular. Só não pense que esqueci você. Meu estômago ronca de fome e me traz de volta à essa realidade. Volto a perceber o som do relógio e percebo que é quase hora de ir, que muitos minutos se passaram enquanto eu pensava em você.
Que grande perda de tempo.
Tic Tac.

Desencontro.

Parece que ele sabe... Às vezes acho que ele pode mesmo sentir. E às vezes até acho que ele sente o mesmo que eu. E - malditas asas queimadas! - às vezes eu só queria poder voar para longe dele. Mas não. Autocontrole nunca foi uma característica a qual me dediquei.
- Oi - ele disse com sua voz baixa.
- Oi - me limitei a responder.
- Só liguei para saber se você estava bem...
- Eu estou. - e fugia das respostas quase tanto quanto fugia do contato. E não lhe faço perguntas. Sempre tenho medo das respostas, embora tudo o que eu quisesse era tê-lo deitado no meu divã, para então lhe arrancar todas as verdades.
- Ah, que bom. Queria dizer também que eu estava com saudades...
- Você sempre está, - respondi. - mas acho que isso nunca melhorou as coisas entre nós.
- Pare de me tratar assim... - sua voz era reticente e triste. De uns tempos para cá, sua voz sempre me soava triste. Mas talvez fosse só o meu coração meio fraco demais.
- Pararei - eu respondi. - É só você parar de me ligar. Ou ao menos tenha a decência de admitir o que você quer. Você quer voltar?
- Não. Eu quero conversar. Quero sentar no seu portão, segurar sua mão e te apertar forte. E te soltar apenas quando a realidade nos obrigar a acordar. - ele riu, triste. - Vamos sair?
Suspirei: Não posso...
- Não pode... ou não quer?
- Os dois.
- Tudo bem. Me desculpe. Não vou mais te ligar.
- Eu sei.
- Então... até semana que vem. - ele fala, triste. E eu solto uma risada triste ao ouvir a velha piada.
- Até. Se cuide. E volte para quem sabe devolver as minhas asas.
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